Diário Underground #7

Diário Underground #7

13 de junho de 2018 481 Por Yasmin Ramyrez

Fui acampar, acabei sendo salva por uma boneca inflável e só conheci o Campo da Gringa.

Cara, na moral, na minha cabeça hippie-punk, se você curte Rock e nunca acampou… tu é leite com pêra! Reconheço que esse é um pensamento bem problemático por si só (ai que se dane) e veja bem, existem formas e formas de acampar: em campings em que as pessoas vão com seus motorhome, trailers; campings badalados e todo equipados, com água quente, com chalés ou já com barracas no local; campings fuleiros com banheiros horríveis, “cozinha coletiva” nojenta; tem os campings selvagens, que é quando você vai pra um lugar lindo que não tem entrada paga e você simplesmente coloca sua barraca lá e leva/improvisa tudo o que for necessário pra curtir sua estadia na natureza e existe o largamento, que consiste em basicamente você ir pra um lugar bonito, com alguns amigos desocupados, retardados e sedentos por aventuras o bastante pra muitas vezes estarem apenas com cachaça e a roupa do corpo e com elas permanecerem por dias. Adivinhe qual a minha predileta?

Exceto a primeira, tenho experiência em todas as categorias de camping citadas. Tenho vasta experiência nas duas últimas modalidades e me veem tantas histórias na cabeça que já penso em fazer uma parte II deste texto, espero que gostem.

Acampei pela primeira vez, eu não tenho certeza, mas acho que foi em 1997, com 18 ou 19 anos. Fui com uns garotos skatistas de Vilar dos Telles, bairro de São João de Meriti, Baixada Fluminense, RJ. Fomos para a Praia do Saco de São Francisco, na região de Mangaratiba. Camping selvagem. Barracas deles, comida, bebida, toca-fitas com muitas K-7 do Racind, Suicidal Tendencies, NOFX, Nirvana… (que ficaram cheias de areia)! Até aí normal, mas lembro que os caras tinham umas coisas de encher de ar que pareciam duas pernas, elas foram batizadas de “Flávia Inflável” e a gente prendia aquilo na cintura e boiava… Até o momento em que eu fiquei ilhada num ponto lá que a maré subiu, morrendo de medo e passei por algo ridículo até pra mim: fui salva por um maluco que usou aquele troço inflável como boia. Depois ficaram gritando o resto da noite: “Flavia Inflável salvou a Paçoca! Viva!” E jogavam as pseudopernas infláveis pro alto e riam da minha cara. Fizeram música pra Flávia e cantaram em volta da fogueira; inventaram um culto pra Flávia!!! Eu olhava, ria e já pensava que minha vida não seria nada convencional.

 

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Depois disso, acampei muitas vezes com o Rato Branco, era muito foda! A gente ia pra Conceição de Jacareí, também na região de Mangaratiba e encontrava por lá vários amigos artesãos: Nana, Paes, Marcão, Paraná, Sansão, Jacaré, Augusto, Índio, Marquinhos Cabeludo, Jacqueline, Sandro, Raposão, Xu (alguns malucos de BR, outros não)…  E centenas, milhares de pessoas, sobretudo de baixa renda, chegavam em transporte público, em excursão, em kombão, pra acampar em Conceição e desfrutar de seu mar e suas cachoeiras. Muitas famílias, muitos doidões. A gente ia atrás da grana do primeiro grupo e da cana e zoeira com o segundo. Passei vários Revellions e Carnavais em Conceição vendendo artesanato. Foi uma época de ouro na minha vida e eu, “inocente, pura e besta”, acreditei que nunca acabaria. Notem que não havia área de camping oficial em Conceição, ou era camping selvagem ou largamento e eu só fui ter barraca de camping em 2000, então já dá pra imaginar a largação total. Pra dar uma noção: a gente dormia na areia, ou no coreto da cidade ou na varanda de quiosque na beira da praia. hahahaha

Certo dia, milésima vez na cidade, Rato e eu decidimos dar um rolé, sair um pouco de Conceição. Fomos pro ponto do ônibus a tardinha e primamos pelo modo sufle: vamos pegar o primeiro ônibus que passar (ah! A juventude!). Lembro que demorou um bocado até que finalmente avistamos o letreiro “Angra divisa Paraty”. Opa! Vamos pra Paraty! Todo mundo fala de Paraty! Vamos! Tem muito turista lá, vamos vender tudo! Entramos. Felizes. Nos sentindo sortudos, bem sucedidos! E esnobamos: “Tô enjoado de Conceição, sempre a mesma coisa, a galera bebe o pouco que vende, não dá rolé nenhum! Bora pra Paraty”, pensamos. Rodamos durante um bom tempo naquele ônibus e já escurecia quando o cobrador disse: “ponto final”! Moço, aqui é Parati (era montanha de um lado, mato do outro, umas 2 ou 3 casinhas, um ponto de ônibus cheio de mato e nenhum humano a vista)? “Não. esse ônibus não vai pra Parati. Aqui é DIVISA com Paraty. Pra Paraty vocês tem que pegar outro ônibus.”

A gente só tinha dinheiro pra mais uma única passagem, era voltar pra Conceição ou arriscar ir pra Paraty só com os trampos e fazer grana lá. Arriscaríamos, claro! Não deu. Naquele horário, fim de semana, não tinha nem mais ônibus pra Paraty , nem de volta para Conceição. Estávamos presos no meio do nada, duros, com meio maço de cigarro, nenhuma bebida, alguma besteira pra comer e deveria ser umas 20h… sei lá… Até o isqueiro não riscava! Lembro do Rato se jogar na frente de uma cara que passava de bike, pedindo pra acender o cigarro e o cara tentar fugir pensando ser assalto. Que noite longa!!! Eu tinha ervas que temperam e acalmam comigo, deixei a bolsinha guardada no mato, com medo de problemas. Dormimos com frio no ponto feito de pedra. Pela manhã acordamos com o barulho do ônibus chegando, ai que alegria! Nos ajeitamos e entramos. Só depois do ônibus arrancar eu me lembrei que esquecera a bolsinha com a erva medicinal no mato. Droga!! Droga!!! Moço qual é o nome desse lugar maldito pra eu nunca mais voltar aqui, perguntei pra alguém no busão e ouvi como resposta:“Campo da Gringa”.

Ao chegarmos em Conceição, sujos, com fome, cansados, duros e frustrados, ouvimos de dois de nossos amigos sobre a noite fodástica que havíam tido: venderam muito artesanato e apareceu um gringo que pagou várias rodadas de cerveja e ainda passearam de carro com ele. E lá se foram mais 58735 fins de semana em Conceição de Jacareí.

 

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Mais aventuras de acampamento e largamento, quarta que vem.

Deixe suas histórias na caixa de comentários. Se tiver alguma comigo, melhor! Pode ser que eu a mencione semana que vem!

 

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Diário Underground, minhas histórias no underground Rock n Roll do Rio e Baixada Fluminense, todas as quartas aqui no blog da Oficina do Demo. Como tenho memória de peixe, não espere fidelidade aos fatos. Críticas, sugestões, comentários sobre o texto: caixa de comentários, logo abaixo do texto. É pessoal? Vai no reservado. Beijinhos paçoquísticos.

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Who’s that girl?

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Paçoca Psicodélica, vulgo Yasmin Ramyrez. Cigana-hippie-punk, libriana, filha de Oyá, feminista com ascendente em tretas, mãe de adolescente. Educadora, escrivinhadeira, “missionária” do coletor na Copinho da Revolução, aprendiz de cartomante, ex-doula, no underground desde 1996, co-criadora e produtora do Festival Hippie Punk Beatnik, vocalista e produtora da Ramyrez 77, produtora e apresentadora do podcast Bora Marcar?, colunista quinzenal em One Degrau, fábrica de ideias.

 

Beijinhos paçoquisticos.